Mais da metade dos municípios cearenses onde a oposição venceu nas eleições de 2024 apresentaram algum tipo de irregularidade, conforme levantamento do Tribunal de Contas do Ceará (TCE-CE). Dos 184 municípios, 93 elegeram novos prefeitos.
Em 40 deles, a oposição ao gestor anterior saiu vitoriosa, não havendo reeleição nem continuidade de aliados. Em 22 dessas cidades, o Tribunal instaurou representações para apuração de responsabilidades que envolvem 130 agentes públicos, entre eles 22 ex-prefeitos e seis empresas contratadas por prefeituras. O levantamento identificou 95 ocorrências de irregularidades.

De acordo com o TCE-CE, 17 municípios são considerados de maior risco e nesses locais houve inspeções presenciais, priorizando quatro eixos: processo de transição, preservação de dados e informações, continuidade de serviços e gestão patrimonial.
De acordo com o diretor de Fiscalização de Atos de Gestão I do TCE, Cristiano Goes, os problemas mais graves foram de natureza financeira.
Caucaia
Em Caucaia, segundo maior colégio eleitoral do Ceará, o TCE registrou a maior concentração de condutas irregulares durante a transição. O município era administrado por Vitor Valim (PSB). O então gestor não disputou reeleição, mas apoiou Waldemir Catanho (PT), que não foi eleito.

Entre as falhas apontadas estão inadimplência no programa Bora de Graça, recursos internacionais não executados, débitos com concessionárias de energia e água, além de pendências com mais de 650 fornecedores. A assessoria do ex-prefeito informou não ter sido notificada até o início de outubro e assegurou que “todos os pontos citados serão devidamente esclarecidos de forma transparente e responsável”.
Cascavel
O município de Cascavel reúne o maior número de agentes públicos sob investigação. Entre os citados estão o ex-prefeito Tiago Lutiani, ex-secretários, gestores de unidades e integrantes da equipe de transição. As inspeções identificaram fragilidades nos dados e sistemas de informação, interrupção de serviços públicos essenciais e irregularidades na entrega de bens patrimoniais.

Em nota, o ex-gestor informou ter respondido integralmente ao relatório e prestado todos os esclarecimentos solicitados. Tiago atribuiu parte das falhas a bloqueios judiciais das contas municipais, que, segundo ele, impactaram o cumprimento de obrigações da Prefeitura. “Sobre a questão dos bloqueios, mesmo com as contas bloqueadas, o município não parou os serviços essenciais”, diz um trecho do texto.
Fortaleza
Na capital, o TCE indicou quatro tipos de irregularidades sob responsabilidade do ex-prefeito José Sarto (PDT), de ex-secretários e ex-superintendentes do Instituto Dr. José Frota (IJF). Entre os apontamentos estão desabastecimento de medicamentos e insumos hospitalares, paralisação de atividades por atrasos em pagamentos e desequilíbrio financeiro ao final do mandato.

A assessoria de Sarto negou as irregularidades, afirmando que a transição teve “mais de 30 encontros com participação ativa da equipe” e que o Município foi entregue com mais de R$ 630 milhões em caixa. A nota também mencionou “perseguição contra a gestão anterior pela atual” e garantiu que “as questões do Tribunal serão devidamente esclarecidas no momento oportuno”.
Demais Municípios
Em Pacajus, três ex-prefeitos — Bruno Figueiredo (PSB), Faguim (PSB) e Tó da Guiomar (Republicanos) — foram citados em representações do TCE. Eles são apontados por descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, ausência de plano anual de contratações e débitos com concessionárias de energia.
Em suas defesas, Faguim afirmou que comandou a Prefeitura por 88 dias e documentou reuniões com representantes da Enel. Bruno afirmou que saiu do cargo em abril do ano passado, o que faz com que ele não tenha participado da transição. Já Tó da Guiomar optou por não se pronunciar.
Em Crateús, o relatório menciona Marcelo Machado (Solidariedade) e Dr. Nenzé (PSB), que se revezaram na chefia do Executivo municipal em 2024. Ambos não se manifestaram.

Ex-gestores de Pacatuba, Pentecoste, Canindé, Jijoca de Jericoacoara, Novo Oriente e Frecheirinha também foram mencionados. Em Canindé, Rozário Ximenes (Republicanos) alegou que entregou a gestão “adimplente”. Em Jijoca, Lindbergh Martins (PSD) disse ter ficado “surpreso com esse relatório”. Segundo ele, uma sala foi montada dentro da Prefeitura para que a transição fosse realizada e acrescentou que “não teve dificuldade de nada”.
O contador do ex-prefeito de Novo Oriente, Neném Coelho (PSB), informou que “as duas pendências foram sanadas” e o TCE havia sugerido que o processo fosse arquivado. Já a defesa de Helton Luís, ex-prefeito de Frecheirinha, negou qualquer falha, assegurando que os serviços foram mantidos.
Também foram citados no documento os ex-prefeitos de Ipu, Robério Rufino; São Luís do Curu, Chico Abreu; Morada Nova, Wanderley Nogueira; Acopiara, Antônio Almeida; Itapiúna, Dário Coelho; Penaforte, Dr. Rafael; Tarrafas, Tatiano; e Campos Sales, João Luiz. No entanto, não se manifestaram sobre o assunto.
Guaramiranga e as Câmaras Municipais
O município de Guaramiranga foi o único a não entregar o relatório de transição no prazo, o que levou o TCE a realizar uma inspeção extraordinária já na nova gestão, de Ynara Mota (Republicanos). Após a fiscalização, o documento foi protocolado.
Entre as Câmaras Municipais, 113 enviaram relatórios, 36 ficaram dispensadas por reeleição dos presidentes e 65 descumpriram o prazo. O Tribunal notificou as casas em atraso, restando 35 pendentes até o fechamento do relatório.
Próximos Passos
O TCE avaliou de forma positiva o processo, destacando que o início das gestões de 2025 não foi marcado por decretos generalizados de emergência administrativa. Apenas cinco cidades emitiram decretos pontuais: Araripe, Barreira, Itapajé, Juazeiro do Norte e Salitre.
As representações de Canindé e Ocara já foram julgadas e 15 inspeções tiveram parecer finalizado. Segundo o diretor Cristiano Goes, o Tribunal pretende concluir o julgamento dos demais casos até o início de 2026.
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