O senador Delcídio Amaral (PT-MS) mencionou o nome de nove senadores em sua delação premiada. A maioria é do PMDB, como o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL) e o líder do partido no Senado Eunício Oliveira (CE). Segundo o delator, o grupo tinha muita influência na área de energia, inclusive em obras de grande porte como a usina Belo Monte. Mas depois, em função inclusive das investigações da Operação Lava-Jato, passou a diversificar seus interesses e a mirar em áreas como o setor financeiro, planos de saúde e indústria farmacêutica.
De acordo com Delcídio, uma figura-chave do PMDB do Senado para os desvios no setor de energia era Silas Rondeau, ex-ministro de Minas e Energia entre 2005 e 2006. Rondeau é ligado ao ex-senador José Sarney (PMDB-AP). Segundo Delcídio, ele operava para o núcleo duro da bancada peemedebista, composta pelos senadores Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (RR), Eunício Oliveira (CE), Valdir Raupp (RO) e Edison Lobão (MA), com influência de Sarney. Além deles, Delcídio diz que o senador Jader Barbalho (PA) também é beneficiário do esquema.
Em 13 de fevereiro, Delcídio prestou depoimento mencionando desvios de, pelo menos, R$ 30 milhões na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, para políticos do PT e do PMDB. Segundo o termo de colaboração do senador, “pelo PMDB, Silas Rondeau destinou ditas propinas para o grupo de José Sarney, do qual fazem parte Edison Lobão, o próprio Silas Rondeau, Renan Calheiros, Romero Jucá, Valdir Raupp e Jader Barbalho”. O dinheiro viria da Andrade Gutierrez, empreiteira que tocava as obras. Outra hidrelétrica sobre a qual Rondeau teria interferência era Jirau, em Rondônia.
Já em 14 de fevereiro, ao ser questionado sobre Silas Rondeau, Delcídio disse que o ex-ministro “é o grande articulador” do grupo e “era a pessoa que mapeava os negócios”. De acordo com o senador, “ao ter conhecimento de projetos, Silas costura, dentro do Ministério de Minas Energia e com as empresas, a execução desses projetos”. Além disso, ele “ia até as empresas interessadas, se apresentava como intermediário de um ou mais integrantes desse núcleo duro e oferecia negócios com eventuais contrapartidas financeiras ilícitas para os integrantes desse núcleo”.
Delcídio, em 11 de fevereiro, destacou que o então diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa perdeu força no cargo após o escândalo do mensalão ser revelado em 2005. Isso porque um dos investigados era o então deputado José Janene (PP-PR), padrinho da indicação de Paulo Roberto. Como Delcídio também estava enfraquecido no governo, por ter presidido a CPI os Correios, que investigava o mensalão, seu indicado para a diretoria da Área Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, também corria risco. Mas o PMDB acabou apoiando a manutenção dos dois. Ambos são investigados na Lava-Jato e firmaram acordos de delação premiada.
“Quem conduziu este processo de o PMDB ‘assumir’ a Diretoria Internacional e a Diretoria de Abastecimento foi o então Ministro de Minas e Energias Silas Rondeau, que era ligado ao PMDB do Senado, em especial a Romero Jucá, Edison Lobão, Renan Calheiros e Jader Barbalho”, diz trecho do termo de colaboração de Delcídio.
Os riscos de fazer negócios ilícitos em setores investigados na Lava-Jato fez o cenário mudar, segundo Delcídio. Em 13 de fevereiro, ele informou que “há verdadeira ‘queda de braços’ para indicação de nomes para as agências reguladoras relacionadas à área da saúde, até pela visibilidade negativa que o caso Lava-Jato impôs aos setores de energia, engenharia e petróleo”. Em outro depoimento, no dia seguinte, ele reiterou: “Com essas confusões todas, em função da operação Lava-Jato, houve migração da atuação para outros setores, como saúde e sistema financeiro.”
Entre as acusações contra senadores do PMDB, está a de atuarem para laboratórios farmacêuticos e planos de saúde. Delcídio afirmou, por exemplo, que hoje “está a cargo do PMDB do Senado indicar nomes para agências reguladoras ligadas à área da saúde”, e que “os senadores Eunício de Oliveira, Romero Jucá e Renan Calheiros possuem papel e força incontestável quanto a essas indicações”. Em outro ponto, “rememora que houve queda de braço ‘tremenda’ para a indicação de José Carlos de Souza Abrahão (sic), apadrinhado do PMDB do Senado, para o cargo de diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde (Suplementar)”. A agência informou que não vai comentar a delação.
Ainda segundo Delcídio, Renan conversou com várias empresas para bancar a candidatura de seu filho, Renan Filho (PMDB), eleito governador de Alagoas em 2014. Mas ele era cauteloso ao cuidar desses assuntos. Em 14 de fevereiro, Delcídio disse que Renan era “muito cuidadoso e discreto nas suas articulações” e “uma pessoa que conversa diretamente apenas com pessoas com as quais tenha muita proximidade”. Além disso, “normalmente Renan se serve de terceiros”, como o deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE) e o lobista Milton Lira. Aníbal falaria em nome de Renan em várias estatais, como Petrobras e Eletrobras.
Em relação a Lobão, Delcídio também disse que ele tinha influência no Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios. Irregularidades no Postalis e outros fundos de empregados de estatais estão no foco de uma CPI que funciona atualmente na Câmara. Afirma ainda que Jucá era um interlocutor frequente do banqueiro André Esteves, acusado de atrapalhar as investigações da Lava-Jato e que, assim como Delcídio, chegou a ser preso.
Nessa terça-feira, Renan deu entrevista negando as acusações de Delcídio e as taxando de “delírio”. No sábado, quando veio a público parte da delação de Delcídio em relação aos senadores o PMDB, Jucá, Eunício e Raupp já tinham negado as acusações.
OUTROS PARTIDOS
Delcídio fez menções a outros três senadores: Aécio Neves (PSDB-MG), Humberto Costa (PT-PE) e Gleisi Hoffmann (PT-PR). Aécio teria recebido propina desviada da estatal Furnas, do setor elétrico, e atuado para maquiar dados que o comprometeria na CPI dos Correios. O tucano nega as acusações. Em relação aos dois senadores petistas, já há inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) investigando-os no âmbito da Operação Lava-Jato.
Em relação a Humberto Costa, afirma que ele “agiu com desenvoltura na refinaria de Suape (PE)”. Diz que o colega foi “parceiro” de empresas e cita que a White Martins “sempre contribuiu decisivamente para suas campanhas”. Cita o empresário Mário Beltrão como operador de Humberto Costa e afirma que havia proximidade do senador com o ex-diretor Paulo Roberto Costa. As informações constam no anexo preparado pela defesa de Delcídio, e o senador disse não ter mais o que acrescentar sobre o tema.
Humberto Costa, por meio de nota, afirmou que as citações são um “apanhado de notícias já veiculadas” com base na delação de Paulo Roberto Costa. Ressalta que o ex-diretor já teria mudado de versão seis vezes. Afirma que a White Martins jamais contribuiu para suas campanhas e que a empresa não está sob investigação na Lava-Jato. Diz ainda que pediu a seus advogados para solicitarem um depoimento de Delcídio no inquérito em que é investigado no STF.
No caso de Gleisi Hoffmann, ele afirma ser “notória” a relação dela e do marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, com a Consist. Afirma que tal empresa “sempre atuou como braço financeiro dos mesmos”. Afirma que é preciso dar “atenção especial” ao período em que Gleisi foi diretora financeira de Itaipu, “quando vários ‘claims’ de obras passaram pelas suas mãos”. Diz ainda que devem ser analisadas as concessões de áreas isoladas do Porto de Santos (SP). Assim como no caso de Humberto Costa, Delcídio não acrescentou informações sobre Gleisi.
Em nota, Gleisi disse que a delação de Delcídio não aponta nem ilícitos nem indícios que levem a esses ilícitos. “São ilações apoiadas em matérias que já foram veiculadas pela imprensa”, disse Gleisi.
Delcídio também citou o deputado e ex-senador Alfredo Nascimento (PR-AM). No anexo 10 da delação, ele fala da Operação Lama Asfáltica da Polícia Federal e afirma que o senador, enquanto ministro dos Transportes, fez um “jogo combinado” com o então governador do Mato Grosso do Sul André Puccinelli (PMDB) e o então secretário Edson Giroto (PR) em um “acordo ilícito” para promover a descentralização de investimentos federais no estado. Afirma que Alfredo arrecadava a propina desse esquema e repassava ao PR e ao PMDB. Diz que esses recursos irrigaram campanhas dos dois partidos em seu estado. Afirma que a Operação Lama Asfáltica descobriu apenas alguns pontos do esquema e que estaria encontrando dificuldades para avançar. O senador, porém, disse não ter mais informações a acrescentar.
CE.A. – Com informações do O Globo