
Mesmo durante o Outubro Rosa, mês dedicado à sensibilização sobre a prevenção do câncer de mama e do colo do útero, uma parcela significativa das mulheres brasileiras ainda não consegue dar o primeiro passo em direção ao zelo com a saúde íntima. O motivo, segundo especialistas, vai além da falta de conhecimento: o receio, constrangimento e vivências traumáticas têm afastado pacientes dos consultórios ginecológicos.
De acordo com pesquisa da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), em colaboração com o Datafolha, 5,6 milhões de brasileiras não têm o hábito de procurar o ginecologista e 4 milhões relatam nunca ter ido a esse profissional. O número é alarmante, principalmente porque o câncer de colo do útero é o terceiro tipo mais comum entre mulheres, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), e pode ser evitado ou identificado precocemente por meio de exames simples, como o Papanicolau.
O ginecologista, Dr. Bruno Soares, explica que a dificuldade vai além do acesso aos serviços médicos. “Ainda existe um tabu em torno da saúde íntima feminina. Muitas mulheres têm medo ou vergonha do exame e acabam adiando a consulta por anos,” afirma.
O médico afirma que a consulta deve ser um momento de cuidado e confiança. “O atendimento precisa ser humanizado. Quando a mulher se sente respeitada, ela volta ao consultório e cria rotina de prevenção,” explica o médico.
Para a psicóloga Thamires Aragão, que trabalha no acolhimento e apoio terapêutico de mulheres, o medo também tem raízes emocionais. “A consulta ginecológica envolve exposição física e emocional. Para muitas mulheres, especialmente as que viveram situações de abuso ou tiveram experiências negativas, esse momento pode ser gatilho de ansiedade e até de pânico”, aponta.
As implicações da falta de acompanhamento vão além da saúde corporal. Condições como endometriose, miomas e infecções ginecológicas podem evoluir sem sinais visíveis, enquanto o impacto psicológico se agrava. “A mulher que vive afastada do cuidado muitas vezes sente culpa, medo e vergonha. Isso gera um sofrimento silencioso e, em alguns casos, adoece tanto quanto a doença física”, diz a psicóloga.
Ambientes que ofereçam privacidade, explicações claras sobre os procedimentos e a opção de um primeiro atendimento apenas com conversa podem ser determinantes para romper barreiras. Além disso, a ausência de acompanhamento acarreta riscos reais. “Doenças como infecções, endometriose e até câncer podem evoluir sem sintomas no início. A prevenção é sempre o melhor caminho,” alerta o médico.
“O ginecologista não está ali só para tratar doenças, mas também para prevenir, para orientar, para escutar. É um cuidado que envolve o corpo e a mente”, disse o médico.
Neste Outubro Rosa, o desafio vai além da informação: é necessário abordar as mulheres que ainda não conseguem se engajar. Porque, antes de cobrar o autocuidado, é essencial assegurar que todas tenham espaço, tempo e acolhimento para se cuidar.