O Brasil registrou uma queda superior a 30% no desmatamento em 2024, segundo o Relatório Anual de Desmatamento (RAD) do MapBiomas. No entanto, a Área de Proteção Ambiental (APA) da Chapada do Araripe, no Ceará, seguiu na contramão da tendência nacional e manteve índices elevados de degradação. Foram 5.965 hectares desmatados — praticamente o mesmo volume de 2023 — colocando a unidade de conservação entre as três mais afetadas do país.
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Para Carlos Augusto Pinheiro, chefe do Núcleo de Gestão Integrada (NGI) ICMBio Araripe, o cenário é preocupante. “Quando analisamos os últimos cinco anos, percebemos que estamos longe de frear o processo de degradação”, afirmou.
A APA Araripe é uma unidade federal de uso sustentável, onde atividades agrícolas e propriedades privadas são permitidas. Por isso, especialistas alertam que a região, considerada um dos principais refúgios de biodiversidade e um fenômeno climático no meio do Sertão, corre risco. O ambientalista Basílio Silva Neto explica que o relevo da chapada cria um “oásis de umidade” que influencia as chuvas e o clima de toda a região do Cariri.
Queimadas: um problema crescente
O desmatamento não é o único desafio. O número de queimadas na região segue em alta. Dados do Corpo de Bombeiros apontam que o Crato registrou 68 incêndios em vegetação somente em novembro de 2025, o terceiro maior número do estado. E, mesmo antes do fim do ano, os registros de 2025 já superaram o total de 2024: foram 843 ocorrências até novembro, contra 776 no ano anterior.
Segundo ambientalistas, o clima mais seco, as ondas de calor e o uso do fogo para limpeza de terrenos agravam o cenário. A fumaça e o aumento das temperaturas afetam diretamente a fauna, a flora e a qualidade de vida da população.
A luta dos meliponicultores
No Crato, o meliponicultor Igor de Souza Lacerda relata perdas significativas na produção de mel devido às queimadas. As chamas afetam tanto as árvores que abrigam ninhos de abelhas quanto as flores usadas para alimentação. “Perdi enxames inteiros. É um prejuízo econômico e ambiental”, conta. Ele e a família também atuam com educação ambiental, recebendo estudantes em seu meliponário para conscientização sobre preservação.
“Queimar terra é uma prática ultrapassada. Temos muitos conhecimentos e tecnologias que podem substituir isso”, reforça Ana Carla Lacerda.
Fiscalização reforçada
Para combater o avanço do desmatamento, diferentes órgãos têm atuado em parceria na APA Araripe. A Polícia Federal realizou, em outubro, a Operação Woodtrack em quatro municípios da região, resultando em autuações, apreensões e embargos. Já o Ministério Público criou o projeto APA Regular, que busca estruturar conselhos municipais de meio ambiente e ampliar a fiscalização em cidades que integram a unidade de conservação.
“A presença ativa dos conselhos aproximou a população dos órgãos fiscalizadores, o que fortaleceu a denúncia e ajudou a coibir crimes ambientais”, explica o promotor Thiago Marques.
Plano de manejo é urgente
Apesar dos esforços, especialistas apontam a falta de um plano de manejo como um dos principais entraves para a preservação efetiva da APA. O documento, segundo Basílio Neto, é essencial para orientar produtores rurais e garantir o uso sustentável da região. O ICMBio informou que o plano está em fase de consolidação final.
Riqueza científica ameaçada
A Chapada do Araripe é reconhecida pela rica biodiversidade, abrigando espécies únicas — como o soldadinho-do-araripe — e uma grande variedade de plantas usadas em pesquisas científicas. Entre elas está o cambuí, fruto nativo que vem demonstrando potencial no combate a superbactérias resistentes, segundo estudos de universidades federais.
“Pode haver plantas com propriedades incríveis que ainda nem conhecemos e que podem desaparecer com o desmatamento”, alerta Basílio.
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